Monday, October 29, 2007

Precisei resenhar um filme para um atividade na faculdade. Tinha que ser algo que tivesse o jornalismo como pano de fundo (é óbvio que não somos coorporativistas, de onde tirou essa idéia, bastardo!). Da lista preliminar acabei ficando com o velho conhecido Hunter. Havia outras coisas bacanas (Boa Noite e Boa Sorte, Todos os Homens do Presidente, Cidadão Kane, a Montanha dos Sete Abutres, Quase Famosos...). Na empreitada acabei topando com Antonioni (Profissão: Repórter - aliás, quem diabos traduziu esse título?! E quem diabos o colocou na lista?! Dava pra pelo menos ter assistido ao filme antes e descobrir que ele fala de tudo, menos da "profissão repórter"?!), um diretor que eu desconhecia e tive a oportunidade de descobrir que acho extremamente chato – ou sou extremamente azarado, das duas uma. Não sei fazer resenhas (resenhista? resenhador?) e não sou bom pra avaliar nada segundo aspectos técnicos. De forma que todo ser com pelo menos dois neurônios funcionando de forma aceitável saberia que isso daria merda. Segue:


MEDO, DELÍRIO... RODANDO!
Como cobrir uma corrida de motocicletas no deserto de Nevada, nos arredores de Las Vegas, o coração do Sonho Americano? Um jornalista convencional levaria uma pauta. Mas Hunter S. Thompson, o mentor do desmiolado Gonzo Jornalism, podia ser tudo, menos convencional. Então, convocou um demente advogado “samoano” para a viagem e encheu o porta-malas de um Chevy tubarão vermelho com toda a variedade de narcóticos em que conseguiu pôr as mãos. A viagem até Las Vegas, a “cobertura” da corrida e, posteriormente, de uma convenção estadual antidrogas, por dois irremediáveis casos de toxicomania virariam Medo e Delírio em Las Vegas, obra-prima do jornalismo gonzo e livro subversivo de cabeceira de onze em cada dez estudantes românticos, admiradores dos idos tempos da arte dos mensageiros.
Um esclerosado como Thompson transformou a mistura de drogas, subjetividade, ficção e jornalismo em um livro que jogou a última flor em cima do túmulo da contra-cultura norte-americana. E, como sempre existe alguém que surfa a onda da loucura alheia, Terry Gilliam (Os 12 Macados, Monty Python) foi tentar botar ordem na anárquica narrativa thompsoneana e reescrever tudo, desta vez com luz. Na pele do Dr. Gonzo, Jhonny Depp (Edward Mãos de Tesoura, Piratas do Caribe), o galã norte-americano que foge dos papéis de mocinho como o diabo da cruz, amigo pessoal de Hunter e especialista em trejeitos – algo fundamental quando se quer dar a idéia da figurinha ímpar que era Thompson. Na carona do Chevy tubarão, Benicio Del Toro (Sin City, 21 Gramas), vivendo o advogado “samoano” sem nome e nenhuma função mais importante no conjunto da obra do que ajudar Thompson a manter-se perenemente chapado.
Como em todo filme que se baseia em livro, perde-se muito da narrativa original. Como em nem todo filme baseado em livro, ganha-se muito espaço para brincar com a câmera e com mirabolantes efeitos das lentes e do tecnicolor – não é sempre que um diretor tem a oportunidade de retratar o mundo da perspectiva de uma cabeça que vivia cheia de ácido lisérgico.
Era para ser apenas uma cobertura sobre uma corrida de motos no meio do deserto, mas se transformou, no fim, numa obra cinematográfica deformada – pelo álcool, pelas drogas, pelos pontos de vista de um jornalista paranóico e rebelde incurável - da América anti-Nixon, anti-Bush, da América do fim da era hippie (onde o psicoativos deixaram de simbolizar uma rebelião coletiva e voltaram ao status da pura busca pelo prazer individualista), da América subversiva que insiste em não morrer e que, no fundo, é a única América que importa.
Tanto livro quanto filme são alguns dos últimos suspiros – espaçados, é verdade – do jornalismo antes rebelde e indomável, mas que agora é só um cadáver pisoteado por uma classe dirigida por academicismos constrangedores e por uma contemporaneidade yuppie. No fundo, todos nós ainda não desistimos de torcer pela volta dos bons tempos. Thompson acabou ficando chateado de tanto esperar e suicidou-se com um tiro na cabeça, em fevereiro de 2006, aos 67 anos. Mau sinal dos tempos.

Thursday, October 25, 2007

Mais coisa antiga, saída de uma insuportável aula de qualquer babaquice relacionada à teorias comunicacionais que não param em pé – devia estar meio dopado, só pode. Trabalhando muito nos últimos dias e sem muito tempo livre (o que tenho, naturalmente, gasto em lugares produtivos como bares e afins). Segue este, hum, hum, texto? Ou seja lá o que for.
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O velho passou tanto tempo amarrado na árvore que não sabe mais aonde ir. Sabe a historinha do dono de circo que amarra o elefante com barbante?
Bá.
"Velho bobo, não dá pra ficar aqui. É uma árvore, velho estúpido".
O velho doido vai morar embaixo da árvore.
...
– Menino, escove os dentes e pare de conversar com o espelho. Vai emporcalhar tudo.
Espelho. O pior inimigo das pessoas feias. Fico biruta com espelhos.
...
Na casa de meu pai há muitos reflexos. Vitrines de lojas espelhadas.
Na casa de meu pai há muitas moradas. Sem luz ou água encanada.
Calçadas que fedem à urina.
Meu pai mora no centro. E lá tem um McDonald's.
...
Velho maluco. Mora em árvores.
...
Não, Bandini, esse velho não dá uma boa história. Ele é louco. E deve estar bêbado. É, biruta e bêbado. Ele mora em árvores. E uma vez já teve uma coleira.
Mas faz muito tempo.
...
Ontem ele tava aqui. Aqui no centro. Aqui onde é sempre domingo à tarde. Aqui, no mais vadio dos dias. O velho que mora em árvores e conversa com cachorros. Aqui. Onde diabos se enfiou? É, naquela árvore. No fim dessa rua.
A árvore com o velho. Ou o velho com a árvore.
Sei lá.

Nas vitrines ninguém conhece o velho. Nem a árvore. Na casa de meu pai é todo mundo muito distraído. Velho doido. Gente biruta. No centro.
Onde meu pai mora. E onde é tudo sempre meio besta.

Tuesday, October 16, 2007

A FANTÁSTICA FÁBRICA DE INUTILIDADES

Sou um homem de muitos projetos – que acabam invariavelmente engavetados. No momento, há dois ou três em fase de "vamos começar com esta porra de uma vez ou tá difícil?" Se tudo der certo (coisa que obviamente não vai acontecer) eles começam a sair da cartola em dezembro. Enquanto isso, ressucito texto antigo, que ia servir de editorial para um projeto igualmente antigo que, se me lembro bem, acabou em um buraco negro depois de tudo estar engatilhado, nos conformes, forno quente e etc. Amnésia alcoólica, desconfio eu.
...

E nestes tempos modernos...

Antes de começar o papo, há uma coisa que precisa ser levada em consideração: agora, nesse exato instante, estando você onde estiver, vivemos a era da internet, a era dos blogs, fotologs, do orkut; a era da comunicação digital instantânea e da difusão de informação via fibra óptica. Um mundo em que as fronteiras são apenas decorativas e onde, como dizia o antigo slogan de um comercial da Gazeta do Povo, “você pisca o olho e ele já não é mais o mesmo” – na real, não lembro direito da frase; era isso ou algo que o valha. O fato é: num mundo desses, em que informação escorre pela sarjeta e estamos conectados com a aldeia global 24 horas por dia, o leitor precisa de alguém que lhe explique o que é verdade e o que é mentira. Alguém que, em meio a isso tudo, o ajude a separar o joio do trigo; a real informação, concreta, imparcial e pluralista, da pura cascata.
Quando você encontrar esse alguém, por favor, nos avise.
Porque, como já diz um ébrio amigo meu, falar merda é uma arte. E das mais eruditas, diga-se de passagem. Pra se falar merda é preciso sofisticação.
Então, este é o primeiro número de uma piada infame, que talvez nem chegue ao segundo. A essa altura, devo dizer, cheio de empáfia, que em matéria de desorganização superamos a imprensa nanica dos anos 60. Nem sequer tivemos a capacidade de sentar, em um bar que fosse, e esboçar algo que pudesse, mesmo que longinquamente, lembrar um projeto editorial. Provavelmente até tenhamos sentado em mesas de bar e pensado nisso, ainda que separadamente, mas depois da oitava dose a grande quantidade de idéias brilhantes é igualmente proporcional a dificuldade de lembrar delas no dia seguinte. De volta ao marco zero, ora pois.
E, na real, esse método nada escrupuloso é bem mais divertido. Mais ou menos como montar uma banda punk em 77. Você só precisa de um cara que aceite pegar o microfone, um que aprenda a dar umas simples baquetadas e dois manés que saibam minimamente empunhar baixo e guitarra – de forma a deixar uma das mãos livres para bater nas cordas. Ta aí. Nem um pouco difícil.
Pois bem, agora já estamos devidamente apresentados, como mandam as regras da boa educação. Cartas pra redação, de preferência sentando o sarrafo.

Monday, October 15, 2007

Bússolas quebradas, afundando a esmo, marola de lâminas contra o casco de papel jornal. E os ratos tomam o navio. Dentes de gilete contra as velas de manchetes populares. O convés sob o carnaval de papel picado, realidade rasgada por caravelas virtuais. Onde estão os caras? Onde estão os botes? Os marujos estão bêbados no cais que se desmancha na tempestade litográfica. Âncoras lisas, cais alado, mar de tinta cor de sangue, sal nos olhos, bichinhos mastigando o leme. Sem tempo, sem saco, sem talento pra vida ou vocação pra morte. Ah, vá lá: tudo a estibordo! Mas o farol é só o estopim de um cigarro em meio à noite úmida.