Quem visita esse blog sabe que eu não costumo usar muito ele para fins confessionais – é meio chato. Mas... essa rapaziada merece.
Troços & destroços
E no princípio era o verbo.
Tudo começa no verbo, porque às vezes a ação é a única maneira. E é ao redor de uma mesa que, desde sempre, a humanidade costuma verbalizar. Um dia, há tempos, eu e mais dois caras nos pegamos ao redor de uma mesa de bar, drenando conhaques pra combater o frio, falando besteiras – mulher, é claro; conversa de homem em bar sempre termina em mulher. A bebedeira deu certo, foi repetida, viramos bons colegas. Eu era então um roceiro, um caipira recém-chegado à “cidade grande” - e continuo sendo. Aqueles dois caras eram as primeiras duas pessoas importantes que eu conhecia por estas bandas... mas só ia descobrir isso algum tempo depois. Viraram figuras de primeira relevância na minha então novíssima rede social. Um dia, decidi que já era hora de chamá-los de amigos mesmo. Os amigos são uma parte do meu catálogo social onde eu incluo pessoas com muito cuidado; pinçadas mesmo. Diferencio muito amizade de coleguismo.
Então, um dos sujeitos resolveu engatar um namoro, sob os veementes protestos dos outros dois. Saldo: tivemos que admitir uma “mina” no meio de nossas conversas de macho, o que incluía a instauração de um novo código de conduta – nada mais de falar de mulheres e aventuras sexuais. Norma baixada, fui o primeiro a fazer questão de desrespeitá-la, na tentativa de afugentar a fêmea. Não funcionou. Tentamos resistir, tentamos fazer bares paralelos, só de homens; mas acho que o amor foi mais forte. Enfim, precisamos nos consolar com o fato de que a Fer estava em meio ao grupo.
Bem, precisávamos então de mais uma mulher, pra fazer companhia a ela, já que uma moça poderia ficar muito constrangida em meio a tanta testosterona. Foi a vez de angariar a Mari, que dos males foi o menor: ela é mais macho que muito homem que eu conheço.
João (o Bolo), Pedro (o Pedrada), Fer e Mari: essas quatro criaturas foram meu porto nesses quatro anos de cidade grande; sem elas eu talvez não tivesse encontrado um lugar razoavelmente seguro para ancorar minhas pernas. Eles me agüentaram. Eu, o especialista em roubadas, um sujeito que exige muito de seus amigos (sobretudo, muita paciência, tenho consciência disso). Multiplicaram-se as bebedeiras, umas brigas, uns acertos de contas... o Bolo emagreceu um bocado – e também sumiu uma época. Hoje, é um homem responsável, de relacionamento estável, quase advogado, de cabelos curtos e sapatos sei lá de que marca (eu não fico prestando atenção nessas frescuras)... veja só, quase um homenzinho! É interessante olhar em retrospecto e ver como todos tivemos nossas mudanças. (Meu Deus!, o Pedro era um surfista!) Não gosto da palavra “amadurecer”, mas creio que todos nos tornamos pessoas um pouco melhores. E, entre mortos e feridos, sempre sobrevivemos.
Conhecemos outros bróders, é claro, mas como diz a Fer, sempre formamos o time do boteco old school. E do time onde esses quatro jogam, só outras duas pessoas fazem parte atualmente.
Como diz a música do Belchior, eu sou só um rapaz latino-americano, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes, e vindo do interior... ou seja: não tenho lhufas, xongas... assim, ofertei a eles a única coisa que tinha e que considerava de valor: lealdade. Espero que, por ventura, não tenha parecido pouco.
Na sexta-feira, tiramos uma foto, pra guardar de lembrança, durante um momento meio “emo”, todo mundo entorpecido de vinho – o álcool, essa coisa que faz aflorar tanto a fúria quanto o sentimentalismo. Nesse momento, perto do fim da faculdade para pelo menos três de nós, os elos vão afrouxando-se, e já começa a dar saudade.
Tenho dois amigos mortos, o que, creio, já é um bom saldo para alguém com 21 anos. Acabei deixando alguns outros para trás, arremessados que vivemos sendo pelo mundo para os lugares mais insólitos. Paciência. A vida nunca foi mesmo reconhecida por seu senso de Justiça. Devo confessar, porém, que invejo os tigres, esses animais solitários que não estabelecem vínculos com nada e vivem (creio eu, nunca fui tigre pra saber exatamente) bem assim.
De qualquer forma, o que quer que aconteça, por favor, cuidem-se, crianças.