Monday, May 01, 2006

PUNK-DARK-PSICODÉLICO

Primeiro eles vinham. Depois já não vinham mais. E finalmente vinham de novo. Uma turnê toda atrapalhada, mas com uma boa notícia no fim. Os homens-coelho tinham incluído Curitiba no roteiro. Pela segunda vez a banda saída de Liverpool em 1978 colocaria os pés em solo curitibano – a primeira tinha sido em 1999. Meu segundo grande show no ano e, depois dos Stones em fevereiro, eu tinha certeza que poucas coisas ainda poderiam me impressionar. E uma delas era o Echo & The Bunnymen.
A noite prometia muito. O Curitiba Master Hall, embora lotado, não estava entulhado. O Echo pode não ser a banda mais famosa do mundo, mas é um culto. Também não é para menos. Os anos 80 por si só já são sagrados. E então, imagine uma banda que resolve misturar a introspecção dessa década com a psicodelia de outra que não deixa por menos. Não deu outra: criava-se um mito.
O show que era para começar as 22h00, só veio mesmo lá pelas 23h30, quando a maioria do pessoal tinha precisado consumir algumas garrafas da água para assegurar a sobriedade durante a apresentação. E lá estava a figura. Cabelos desgrenhados, óculos escuros, blazer preto, jeans surrado: o vocalista Ian MCculloch e seu visual cool. Uma das figuras mais admiradas e copiadas dos anos 80. Uma das melhores vozes da história do rock. Ao lado dele, Will Sergeant, o culpado por aqueles riffs de guitarra que grudam na sua cabeça e mais parecem uma música dentro da outra. E sim, o que se lê por aí é verdade: ao vivo, ele é a cara do Chucky, o brinquedo assassino. O bom é que o cabelo no rosto esconde isso a maior parte do tempo.
O resto da banda, depois da volta, em 1997 – os caras deram um tempo entre 1998 e 1997, período no qual o antigo baterista, Pete de Freitas, morreu num acidente de carro - não é lá muito relevante. Dão a impressão de meros músicos de apoio. Da formação original só restaram mesmo Ian e Will, uma dobradinha que dificilmente conseguiria ser melhor. E para uma banda que tem esses dois, o resto é conversa fiada.
Quem chegou cedo, conseguiu ficar grudado no palco. E eu não sei se em todos os lugares da casa foi assim, mas para quem estava perto a fumaça cuspida em cima do palco durante mais ou menos 1h40 de show só aumentou a atmosfera de transcendência. Aliás, diga-se de passagem, a idade deve estar pesando em cima dos ombros de MCculloch. O cara - famoso por ser uma chaminé ambulante e por acabar quase todos os seus shows bebaço – fumou e bebeu pouco. Não se sabe porquê, mas seu grande companheiro em suas passagens pelo Brasil – o copo de caipirinha – não deu as caras em cima do palco.
O público era variado. Tiozinhos de 40, 50 anos – fãs das antigas da banda, que acompanharam tudo desde o início, e por isso mesmo nos causavam inveja -, e gente de 16, 18, representantes da nova geração perdida que também adotou gente como Smiths e Joy Division. No meio desse povo todo desfilavam uns sósias do Robert Smith. Ah, temos que dar relevância para o sujeito que invadiu o palco no meio do show, pulando que nem criança quando chega no parque de diversões e apontando alguma coisa que eu não consegui ver no próprio peito. Tudo isso para dar um abraço em Ian, receber um sorriso amarelo em troca e ser enxotado pelos seguranças. Impagável.
O SET-LIST
Enquanto todo mundo acreditava que o Echo ia abrir com a clássica Rescue, que desde sempre abriu as apresentações do grupo, os caras decidiram quebrar a rotina, mandando ver em Going Up, a primeira música do primeiro álbum, de 1981, o que não deixa de ser uma boa pedida, além de carregar um quê de elemento surpresa. A voz de Ian é uma atração a parte. Tudo bem, ela não é a mesma dos anos 80, trovejante e arrastada ao mesmo tempo – talvez o resultado de anos de bebedeira e dois maços de cigarros diários – mas continua única. E como ele sabe que a linguagem da música é universal, não perde tempo com introduções ou discursos entre músicas. No máximo um “thank you”. Lá de vez em quando arrisca um “muito obrigado”. No fim, um agradecimento a participação massiva dos curitibanos fanáticos, que cantavam em coro, acompanhavam as capelas com palmas e sempre que os homens-coelho deixavam o palco entoavam gritos de “Echo, Echo, Echo...”.
O que veio depois de Going Up foi uma sessão de hits. Do novo álbum, o Siberia, do ano passado, só estavam no setlist Storm Weather e Of a Life. O destaque do show? Isso é sacanagem. Como é que se escolhe o destaque de uma apresentação que incluí Seven Seas, Bring On The Dancing Horses, All The Jazz, The Back Of Love, The Killing Moon e The Cutter­? – e põe no balde ainda covers de Roadhouse Blues dos Doors e Take A Walk To The Wild Side do Lou Reed.
Mas eu arrisco. Fico com Never Stop - redonda, perfeita ao vivo -, e para os momentos mais introspectivos do show, com Nothing Lasts Forever – no primeiro biss – e Ocean Rain – que fechou do show de uma maneira surreal. O que faltou? Bom, eu acho que tinha espaço para The Game e Do It Clean – que reza a lenda, é a melhor música do Echo ao vivo.
No fim, do lado de fora, o que se via era uma coleção de caras estupefadas. Todo mundo tentando descrever o quanto aquilo tinha sido indescritível. Na boca, um gosto que misturava bebida e cigarro. Deve ser esse o gosto da glória.

Para saber mais:
Quem influenciou:
rock sessentista, principalmente Doors, Velvet Underground, Stooges e David Bowie.
Quem foi influenciado: bom, o Oasis é um bom exemplo. O Liam Gallager copia Ian MCculloch até na pose de marrento.
O álbum que vc precisa ouvir: Ocean Rain
As músicas que não podem faltar: The Killing Moon, My Kingdom, Bring On The Dancing Horses, Rescue, Cristal Days, Seven Seas, Lips Like Sugar, Never Stop, Do It Clean e The Game.

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